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(Foto: Jane de Araújo/Agência Senado) |
Pela primeira vez na história, o Brasil foi incluído na lista dos dez piores países do mundo para a classe trabalhadora pelo Índice Global de Direitos,
divulgado na semana passada durante a 108ª Conferência Internacional do
Trabalho, ligada à ONU. O alerta foi apresentado durante audiência
pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH) nessa segunda-feira (24)
pelo representante do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do
Trabalho (Sinait), Rogerio Silva.
— O Brasil faz parte dos dez piores países do mundo para se trabalhar
em 2019. Pela primeira vez o Brasil entrou nessa lista, junto com o
Zimbábue. O Índice Global de Direitos incluiu o Brasil por ter
considerado que a reforma trabalhista [Lei 13.467, de 2017] impôs
um arcabouço jurídico regressivo aos trabalhadores, baseado na retirada
de direitos. A reforma consolidou um quadro de desproteção ao trabalho,
repressão violenta a greves e protestos, além da intimidação de
lideranças — detalhou Silva.
Também contribuíram no rebaixamento do Brasil os esforços
governamentais visando asfixiar economicamente os sindicatos, com
medidas como o fim das contribuições obrigatórias, levando muitos a
fecharem as portas, diminuindo o poder de negociação dos trabalhadores,
acrescentou o sindicalista.
Além de Brasil e Zimbábue, também estão na lista dos dez piores
países do mundo para a classe trabalhadora Arábia Saudita, Bangladesh,
Filipinas, Guatemala, Cazaquistão, Argélia, Colômbia e Turquia.
Precarização e desemprego
Silva afirmou que o Brasil passou a ser monitorado pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT), devido a denúncias de que estaria
descumprindo acordos internacionais trabalhistas assinados no passado.
Ele e o presidente da CDH, Paulo Paim (PT-RS), também criticaram o fato
de a reforma trabalhista ter sido feita sob o argumento de que geraria 6
milhões de novos empregos. Após quase 2 anos de vigência, o que se vê
foi o aumento no número de desempregados de 12 milhões para mais de 14
milhões de pessoas, afirmaram.
O representante do Sinait criticou ainda o fato de o governo federal
estar neste momento estudando a revogação de 90% das normas
regulamentadoras de segurança do trabalho (as NRs). Silva lembrou que
essas normas foram todas elaboradas por comissões tripartite, das quais a
classe empresarial sempre fez parte, junto com representantes de
sindicatos e do próprio governo.
Desigualdade
A advogada trabalhista Eidy Lian Cabeza, representante do Movimento
da Advocacia Trabalhista Independente (Mati), apresentou dados de um
estudo divulgado recentemente pela Fundação Getulio Vargas (FGV) que, no
entender dela, indicam que a reforma trabalhista e outras medidas com
diretriz semelhante aumentam a desigualdade social.
— O Instituto Brasileiro de Economia [Ibre, ligado à FGV] demonstra
que nos últimos anos, a despeito da profunda crise, os 10% mais ricos
passaram de 49% para 52% na renda nacional. Por outro lado, os 50% mais
pobres viram sua parcela diminuir de 5,74% para apenas 3,5% no primeiro
trimestre de 2019. O número de famílias endividadas já chega a 63,4% no
país, um aumento de 4,4% em relação a maio do ano passado. E para
piorar, o índice de Gini [medição internacionalmente aceita sobre
desigualdade social], que vinha caindo desde a década de 1990, voltou a
subir em 2016 e atingiu seu pior índice em março deste ano — lamentou
Eidy.
O vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça
do Trabalho (Anamatra), Luiz Antonio Colussi, informou que a entidade
mantém gestões junto ao STF visando revogar diversos artigos da reforma
trabalhista. Ele afirmou que a primeira vitória foi a proibição de
grávidas poderem trabalhar em condições insalubres, derrubada no mês
passado. Outro ponto prioritário é derrubar o que chama de “tarifação do
dano moral”.
— No caso do maior acidente de trabalho da nossa história, o
rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, podemos acabar tendo a
diferenciação da valorização da vida humana. Quer dizer, o trabalhador
que ganha menos vale menos que o trabalhador que ganha mais. Isso é uma
flagrante inconstitucionalidade — disse.
Outro participante da audiência, o subprocurador-geral do Trabalho Cristiano Paixão, também considera inconstitucional a MP 873/2019,
que impede os sindicatos de estabelecerem o desconto prévio das
contribuições em folha de pagamento, mediante autorização. A MP exige
que o recolhimento se dê apenas por boleto bancário, o que contraria o
princípio da liberdade sindical, segundo Paixão. Para ele, a medida visa
“matar os sindicatos de inanição, asfixiando-os economicamente ao
extremo”, ferindo acordos internacionais assinados pelo Brasil.
Reforma da Previdência
Na avaliação de Paim, tanto a reforma trabalhista quanto a proposta de reforma da Previdência (PEC 6/2019,
ainda em análise na Câmara dos Deputados) têm o objetivo, entre outros,
de prejudicar a capacidade de organização da classe trabalhadora. Ele
disse não compreender “o porquê da perseguição aos sindicatos” e
acrescentou que nos países de capitalismo avançado, como Alemanha,
França e Estados Unidos, as organizações sindicais têm grande poder de
intervir em políticas públicas para o setor e mediar negociações.
O senador também criticou a argumentação do governo de que as
reformas são necessárias para combater deficits e crises fiscais. Paim
afirmou que em 2017 o próprio governo perdoou uma dívida de R$ 25
bilhões do Banco Itaú e que nada faz visando diminuir apropriações
indébitas de pelo menos R$ 30 bilhões por ano na Previdência, além de
outros R$ 400 bilhões por ano de sonegações e elisões fiscais em geral,
praticadas por grandes grupos econômicos.
Agencia Senado